quinta-feira, 6 de maio de 2010

Conto - A Bruxa e o Lobo - Thiago Assoni



A fogueira crepitava no terreno coberto pelo véu negro do céu noturno. A lua cheia reinava sozinha, iluminando aquele campo de terra batida rodeado por altas árvores de cúpulas triangulares e cheias de folhas amareladas do Outuno.
O círculo estava riscado no chão de terra avermelhada, os elementos necessários dispostos cada qual em seu quadrante: ao Norte reside o elemento terra; ao Sul o calor do fogo; Oeste a força das águas; ao Leste o sussurrar silencioso das vozes que sopram com o vento...
Wanda estava concentrada em seu ritual. Respiração ritmada, olhos cerrados e atenção redobrada. O piar da coruja ao longe e o cricrilar dos grilos ajudavam-na e a embalavam nos cânticos que já haviam sido entoado por suas ancestrais.
Dado certo momento, um som se fez ouvir por entre os montes de mato que cresciam desregrados naquele terreno há tempos abandonado. Ao abrir os olhos, deparou-se com aquele lobo acizentado. Ele parecia observar a garota e Wanda sentiu algo estranho: havia algo naquele olhar que, assustadoramente, parecia-lhe familiar.
Notando que o animal nada faria, Wanda tentou ignorá-lo e voltou suas atenções ao ritual. As palavras saiam sem sentido, quase que em um ritmo cadênciado e incontrolável. Sua mente era invadida por imagens abstratas, em desordem e notou que a fogueira dançava ao vento que surgia ainda fraco. O mesmo vento que sussurrou seu nome.
Assustada ela abriu os olhos.
O vento parou, a fogueira se acalmou... Mas o lobo não estava mais ali. Entretanto, Wanda ainda sentia sua presença. Era como se houvesse algum tipo de ligação. Olhou aos lados, procurando-o, mas não conseguia ver nenhuma vestígio de que ele continuava ali, apenas aquela sensação...
Então, de súbito, um vulto negro cruzou sua frente e Wanda sentiu o coração salta no peito. Ainda que sentisse o lobo por perto, e sabendo que era ele naquele vulto, não via mais um animal peludo ali. Porém, nada conseguia ser desvendado, uma vez que a figura misteriosa encondia-se nas sombras das árvores.
- Quem está aí?
Não ouviu nenhuma resposta, mas identificou um esboço de sorriso, ainda que dentre as sombras. Pouco a pouco, percebeu o rapaz se revelar, caminhando, calmamente, até onde a luz da lua pudesse iluminar seu rosto alvo, quase cinzento.
Era um lindo rapaz! Olhos esverdeados e longos cabelos castanhos que cobriam os ombros largos. Vestia casaca vitoriana acinturada em tom ocre com leves bordados em estilo barroco, calça montaria em um tom um pouco mais escuro e botas pretas altas. E então surgiu o sorriso, agora mais nítido, e aqueles dentes...
Wanda sorriu, enfim, e levantou-se, segura de que não havia perigo algum. Desfez o círculo que marcava a terra vermelha com a ponta do sapato e, rapidamente, correu para abraçá-lo...
- Thuomas! Deu certo!
- Cá estou novamente, bruxa.
- Há muito o que precisa resolver...
- Bem sei disso. - ele sorriu triste. - Mas preciso, ainda, de sua ajuda.
- Contando que pague sua promessa, ajudarei no que for preciso.
Thuomas sorriu e sacou pequeno folheto do bolso interno da casaca.
- Aqui está uma amostra do que posso lhe oferecer... Continue me ajudando e terás todo o caderno de onde esta folha saiu.
Wanda desdobrou a folha e leu seu conteúdo. Sorriu, mas não parecia satisfeita.
- Sabes o que preciso, não é?
- Sei, é claro. Mas também sabes do que eu preciso, não é?
A Bruxa sorriu para o rapaz lupino.
- Claro que sei, vampiro... E vou levar-te até lá...
Thuomas mantinha a pose aristocrata, mas não rude. Os olhos devido à fogueira bruxuleante e, mais uma vez, ele sorriu:
- Por mais que o tempo seja algo insignificante para mim, tenho pressa... Podemos ir?
- Sim, é claro!
Fazendo mesura, o vampiro esticou o braço.
- Primeiro as damas...
Wanda seguiu à frente, tendo o vampiro em seu encalço. E aquela noite dividiria toda a existência da Bruxa, do vampiro e, quiçá, da outra pessoa envolvida.
E então se foram, sumindo por entre as árvores, rumo ao desconhecido, a bruxa e o vampiro.


Continua...?

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