sábado, 10 de janeiro de 2015

Conto - Diamante de Gelo - por Thiago Assoni

 

  Abri os olhos e notei que nada, à partir daquele instante, jamais seria como antes.
  O Inferno não é quente como sempre me fizeram acreditar. Não existe nenhum Vale Sombrio onde almas vagam clamando por salvação e, talvez o mais decepcionante:o Diabo não estava lá ostentando seu tridente a minha espera.
  Era como estar em um enorme campo de neve na Sibéria e tudo estava tão deserto quanto acredito ser no Saara.
  Sentia frio e a claridade ofuscava minha visão. Era tudo de uma brancura insuportável, nada de escuridão eterna!
  Minhas pernas pesavam mais do que eu me lembrava e havia uma fumaça densa que se desprendia do chão, dificultando ainda mais minha visão.
  Apesar de não conseguir ver nada além de uns dez metros, notei algo estranho acontecer na imensidão negra que era o céu acima de mim.
 
Uma dança hipnótica de vermelho, verde e lilás. Ainda que incrivelmente estranho, aquilo me fascinava! Era lindo! Mesmo nunca tendo presenciado aquele evento, afirmo ter visto a Aurora Boreal.  

 Continuei com minha caminhada incerta, quando senti pequena elevação adiante, naquele terreno fofo. Mas era só um presságio de uma imensa parede de gelo que subia íngreme.
  Olhei bem para o alto: eu não ia conseguir subir aquilo tudo. Em um dado momento, a subida ficava quase que totalmente na vertical.
  Toquei aquele gigantesco diamante gelado e, assustadoramente, pouco a pouco, ele enegreceu. Apenas o cume parecia ainda intacto.
   Mas o pior estava por vir...
   O chão estremeceu e ouvi o som do que parecia ser pedras rolando, ainda que não visse pedra alguma. E vi o cume rachar em três partes. Das frestas vi raios violetas subirem ao céu.
   Um vento forte ergueu a neve e agora não pude ver mais nada que não fosse a luminescência lilás que ficava cada vez mais intensa.
   Logo os raios se fizeram ouvir, mas em nada aquilo se assemelhava a trovões. Era como ouvir a eletricidade que emanava das bobinas de Tesla!
  A luminescência tomou todo o céu e era como ver a Aurora Boreal ser puxada, tragada para dentro da pirâmide de gelo.
  E com outro tremor de terra, tudo se aquietou. Eu estava atirado ao chão por não conseguir me equilibrar mais após o brusco movimento das tais placas tectônicas.
  Com o silêncio, a neve também se acalmou e o vento cessou. Vagarosamente pude deslumbrar o local ao qual eu habitava e pensei se não era melhor ter continuado com o véu da ignorância em meus olhos...
  Meu corpo estremeceu incontrolável ao ver aquela cena tão bizarra e horrenda se desenrolar no cume da pirâmide gélida e, outrora, translúcida. Vi Seres de crânios alongados na parte da nuca planando calmamente até tocar o chão tão levemente como uma pluma. Um a uma e mais de cem estavam vindo.
  Eu não conseguia ver seus olhos, pois a luminescência que antes tomava os céus, agora estava bem ao centro de suas testas. Mas eles não eram como os e.t's que que costumamos ver nos filmes. Eram até que bem normais, não fosse o formato craniano mais alongado.
  Os céus pareciam se contorcer em algum canto do Universo e um som estranho ecoava por todos os lados, reverberando em todos os cantos daquele deserto gelado. Era como ouvir o mau contato de uma caixa acústica se repetir continuamente, agudo e e bem ruidoso, quase irritante demais.
  As trombetas apocalípticas não silenciavam e os Seres da pirâmide seguiam para um lugar contrário ao qual eu estava.
  Quando algum tempo se passou e notei não haver mais ninguém saindo do cume da pirâmide de gelo, suspirei aliviado por achar que tudo havia acabado. Então levantei lentamente e senti o frio congelante, por mais redundante que isso possa parecer. Nem ao menos tive tempo para fazer qualquer outra coisa e vi o triângulo girar alto em seu próprio eixo, destruindo por completo aquele diamante negro congelado abaixo de si.
  Um vento ainda mais frio parecia cortar meu rosto e senti alguns pedaços de gelo me acertarem. Outra nuvem branca e pior do que a anterior se ergueu e dificultou minha visão mais uma vez.
   E tudo recomeçou: um grande tremou e a luminescência lilás se fez presente, agora mais branda.
   Ainda que eu sentisse minhas pernas pesadas, tentei correr. Mas foi totalmente inútil! Rolei ao encontrar um obstáculo e fiquei sem saber para onde ir quando atirado no chão novamente. Tentei me arrastar pela neve, mas não havia sustentação para me ajudar a projetar o corpo para frente.
   Fiquei caído ali, sem conseguir mais me mover e foi quando aconteceu: eu senti o chão sumir aos poucos, cada vez mais distantes das minhas mãos. Eu tentava me mexer, agarrar alguma coisa que me mantivesse no chão, mas toda tentativa era vã. Meu corpo não obedecia a nenhum comando!
   Estava sendo levado pelo cume triangular, arrastado aos céus pela luminescência violeta. Abduzido pelo que restara da pirâmide de gelo. Tentei gritar, sem ao menos saber se seria ouvido, mas até mesmo minha voz me traia no silêncio assustador que se seguiu.
  E de repente, tudo escureceu e o mundo que um dia eu havia conhecido se transformou em nada.
  Todo o resto foi apagado de minha mente após aquele momento e eu deixei de existir.


6 comentários:

  1. Uau!! Adorei. E mais uma vez parada aqui pensando no que aconteceu rs. Parabéns!

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  2. Se te conforta saber: nem ele mesmo sabe. hehehehehe

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  3. Sensacional, ansioso para ler os próximos. Parábens

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  4. Muito bom mesmo! Vou conferir os outros do blog também.
    Beijos Migão!

    Migoa Renata.

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  5. Queridos, muito obrigado pelos comentários!

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